por bruna freire ribeiro
Vivemos em uma era marcada pelo paradoxo do excesso: nunca tivemos tantas ferramentas para facilitar a vida, e, ao mesmo tempo, a sensação de sufocamento e exaustão nunca foi tão palpável. Byung-Chul Han, autor do aclamado livro Sociedade do Cansaço, alerta para os perigos dessa realidade: nos tornamos prisioneiros de uma lógica que glorifica o desempenho a qualquer custo, na qual somos tanto vítimas quanto algozes, cobrando de nós mesmos metas, resultados e perfeição incansáveis e inalcançáveis.
Essa hiperatividade constante nos transforma enquanto sociedade, como afirma o filósofo, em “animais trabalhadores”, incapazes de contemplar, concentrar ou simplesmente relaxar. A multitarefa e o bombardeio de informações das redes sociais intensificam a ansiedade e a pressão, alimentando o temido FOMO (sigla em inglês para fear of missing out: medo de estar perdendo algo) e a sensação de que estamos sempre atrasados ou desatualizados. A sensação inalcançável de não estarmos “fazendo o suficiente”, porque sempre tem mais para fazer, mais para conquistar. Afinal, tá lá no Instagram, no Linkedin, no X, que fulano já conseguiu… Isso nos impede de estabelecer presença e uma conexão profunda com a nossa essência e com as atividades que realizamos.
Para as mulheres, o fardo parece ser ainda mais pesado. Além das pressões do mercado de trabalho, enfrentamos a “carga mental” – um conjunto de responsabilidades invisíveis relacionadas ao cuidado com a casa, a família e os relacionamentos. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as mulheres têm 50% mais chance de desenvolver ansiedade do que os homens, reflexo de demandas sociais desiguais e da constante necessidade de equilibrar múltiplos papéis.
Essa exaustão invisível afeta diretamente o sono, o bem-estar e, claro, a saúde mental. Não é surpresa que o excesso de diagnósticos de transtornos como TDAH, TPL e burnout tenha se tornado a imagem fiel de uma sociedade que não sabe desacelerar. Estamos imersos em uma lógica que exige produtividade máxima, com conceitos de superprodução e superdesempenho positivos demais para acionar uma defesa imunológica do corpo capaz de rejeitá-los. E isso torna complexo identificar a violência suave e silenciosa do cansaço, da exaustão e do esgotamento.
Mesmo quem dispõe dos mais diversos recursos para se desconectar, muitas vezes não percebe que está preso em um ciclo de produtividade da abundância, em que o ócio verdadeiro fica em segundo plano. Nesse cenário, o descanso se torna mais uma tarefa a ser cumprida do que uma verdadeira pausa. E a exaustão, embora pomposa e bem disfarçada, também chega, pois o tempo dedicado ao lazer torna-se apenas mais uma extensão das expectativas de desempenho.
No entanto, há iniciativas que nos mostram que é possível buscar outro caminho. Em Portugal, uma empresa de tecnologia, RandTech Computing, implementou a semana de quatro dias de trabalho e, em pouco tempo, relatou um aumento de 20% na produtividade. Com os resultados alcançados verificados, vieram a público compartilhar sua experiência para contribuir com o debate e a reflexão. Esse exemplo é uma lembrança de que desacelerar não é um retrocesso, mas um ato estratégico de valorização do bem-estar que, por consequência, contribui para a produtividade.
DESCANSAR É RE-EXISTIR
Reaprender a descansar é o ato de resistência que os tempos atuais nos pedem. Recuperar momentos de pausa, contemplação e conexão com a natureza e com as pessoas é a estratégia para enfrentar as metas patológicas da ambição desenfreada e abrir espaço para o autocuidado.
Trabalhar, produzir e realizar são atividades edificantes, mas o excesso tende a ser prejudicial. É importante conhecer os limites humanos e saudáveis, e compreender que eles são acessados pela consciência e não pela medida da régua disfuncional e desfocada que o senso comum apresenta. Estar atento ao multitasking, limitar o uso das redes sociais e buscar momentos de verdadeira pausa podem ajudar na autorregulação da presença.
Afinal, o verdadeiro luxo não é ter mais tempo, mas viver com plenitude o tempo que temos. Desacelerar e viver com intenção é o maior luxo que podemos nos permitir em uma sociedade que nos convida a performar como máquinas de eficiente e perfeita produção. E é sempre bom lembrar, a tecnologia é muito maravilhosa e bem-vinda, mas a gente precisa aprender a usá-la de forma saudável e moderada, porque ela já aprendeu a usar a gente.