BENVENUTI A GRAGNANO!
Estivemos no último mês de julho na Itália explorando a história e as curiosidades da pequena comuna da região da Campania, considerada a “Cidade da Massa”
Distante 30 km a sudeste de Nápoles, em uma atmosfera quase mágica que abrange todo o entorno do Vesúvio — o vulcão que devastou Pompeia em 79 d.C. —, está a bela Gragnano, conhecida como “Cittá della Pasta”, por concentrar o maior número dos tradicionais “pastifici” na Itália. “Pastifici” é a denominação, em plural italiano, para as indústrias produtoras de macarrão e massas em geral.
Nessa pequena cidade com menos de 30 mil habitantes, a tradição das massas secas remonta a séculos atrás. Segundo o historiador Giuseppe Di Massa, presidente do Centro Cultural Gragnano, há documentos datados do ano 1200 que já discorriam sobre a produção de “seccata”, a massa seca.


No mesmo período, o médico do rei William II, da Sicília, Giovanni Ferrario, que também era professor de uma faculdade de Medicina em Salerno, falava sobre os benefícios da massa seca de Gragnano e receitava para os pacientes com febre tifoide comer “vermiculos al dente”, macarrão predecessor do “vermicelli”, uma massa comprida um pouco mais espessa que o “spaghetti”.
A massa fresca — uma simples mistura de farinha de trigo, água e ovos — é mais comum nas regiões do Piemonte, da Lombardia e do Veneto, onde é esticada com rolos e cortada na forma de tagliatelle ou tortellini.
A massa seca, por sua vez, necessita de apenas dois ingredientes: água e sêmola de trigo-duro. E é talhada em moldes de bronze (típicos de Gragnano), proporcionando uma textura áspera ao produto final, garantindo à massa a capacidade de absorver mais molho.
Em visita a um dos principais “pastifici” da cidade, o tradicional Di Martino, a gerente de controle de qualidade nos explicou: “Aqui, no sul da Itália, somos muito mais viciados em massas secas”.
FÁBRICA NATURAL DE MASSAS
Do alto da sede do Pastificio Di Martino, fica fácil entender como Gragnano estava posicionada estrategicamente para ser uma fábrica natural de massas. A cidade é cercada por montanhas de três lados e pelo mar do outro, criando um efeito conhecido como “sombra de chuva”, perfeito para secar a massa lentamente ao ar livre, enquanto a brisa marinha sopra da costa.
As seculares construções de Gragnano foram projetadas de forma que o vento úmido, que soprava em diversos momentos do dia, fornecesse ventilação natural, formando um túnel ao longo da antiga via principal da cidade, a Via Roma, onde a maioria das fábricas foi construída.
Quando o rei Fernando II, de Nápoles, visitou Gragnano em meados do século XIX, ficou tão impressionado que escolheu os fabricantes de massa de lá como fornecedores oficiais do palácio de verão em Quisisana, antiga residência real fora de Castellammare di Stabia, a 5 km de distância.
Na mesma época, a massa seca da cidade tornou-se tão popular que o município começou a demolir edifícios antigos para dar lugar a dezenas de fábricas artesanais, que secavam massas em varas de junco penduradas como ramos de salgueiro do lado de fora das casas.


As construções eram posicionadas de modo a não fazer sombra nos vizinhos, e a Via Roma foi ampliada para facilitar o acesso dos fornecedores de matéria-prima do Valle dei Mulini, o famoso vale da cidade, cheio de moinhos antigos (visitamos três deles, inclusive).
Na nossa estadia de cinco dias a essa pequena cidade tão cheia de história, visitamos mais de quatro “pastifici” (desde os menores aos maiores) nos quais tivemos a oportunidade de aprender não somente sobre as técnicas da massa seca, mas também de experimentar uma verdadeira imersão na cultura local, onde ainda conhecemos deliciosos restaurantes e degustamos excelentes vinhos da região — já que as uvas crescidas em solo vulcânico são cheias de nutrientes, garantindo sabores ricos e peculiares.


Para finalizar, nossos anfitriões, os chefs Massimo Battaglini e Giuseppe Barbero, da Slow Food, prepararam verdadeiros “banquetes dos deuses” com vários ingredientes locais. Um sonho!